"Podes dizer-me, por favor, que caminho devo seguir para sair daqui?
Isso depende muito de para onde queres ir - respondeu o gato.
Preocupa-me pouco aonde ir - disse Alice.
Nesse caso, pouco importa o caminho que sigas - replicou o gato."

Lewis Carroll






quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013


Aquilo que  falta

“O que dá o verdadeiro sentido ao encontro é a busca e é preciso andar muito para se alcançar o que está perto.” Esta frase de José Saramago traduz que o caminho que trilhamos e o valor que depositamos diariamente naquilo que julgamos especial, é mais importante que simplesmente atingir nosso objetivo. Conquistar o que se espera é uma alegria desmedida, mas nenhuma conquista é definitiva e sinaliza apenas o início de vários esforços para mantê-la.
O encontro sentimental de um casal é um bom exemplo da complexidade das escolhas, metas e disposições necessárias para além de conquistar, encantar um coração constantemente. Percebemos no cotidiano uma fragilidade nas relações sociais, em que o individualismo e a dificuldade em enxergar o próximo é imensa, refletindo também no comprometimento real entre as pessoas.
Na era do EU, as ações se direcionam para a satisfação do imediato, daquilo que independente do contexto proporcione prazer e nos poupe das responsabilidades que uma vida em conjunto exige. Como usando um controle remoto, temos voltado e acelerado, trocado de canal, desligado e ligado várias vezes nossa vida para esquecer ou nos abster da realidade do mundo, mas neste controle o botão de pause não funciona, pois “o tempo não para” e deixar para depois pode significar deixar para sempre. Parece que naturalmente existe uma desculpa racional e frágil, mas socialmente aceita para justificar nossa escolha pela impotência e inércia. Constantemente ouvimos e dizemos que: “gostaria de ajudar, pena que é muito longe”, “te amo, mas temos que ir devagar”, “ia fazer, mas não deu”, “não tenho tempo”. São frases corriqueiras como estas que resumidamente expressam a dificuldade de assumir o comando dos seus desejos e optar por um caminho onde se assuma os riscos e delícias consequentes dele.
Muitos sujeitos esperam respostas definitivas e externas à suas inseguranças, torcem inclusive para que elas cheguem de modo divino, ou escrito no horóscopo semanal, pois formular e sustentar uma atitude são coisas que parecem estar relacionadas a uma ousadia que ainda não há preparação. Pode ser. Ninguém esta preparado para tudo sempre, mas cabe a nós a tentativa de saciar as dúvidas e, não aos outros.
A confusão geralmente se dá na crença de que podemos obter somente o que há de melhor no outro quando não nos comprometemos de modo integral a alguma coisa ou pessoa, mas esquecemos que em qualquer envolvimento estamos lidando com seres diferentes, carregados de sentimentos e que os dissabores fazem parte de quem convive intimamente e que somente com eles e na relação com o outro é que os percebemos e temos a chance de crescer. Juntos a força sempre aumenta e as dificuldades tornam uma proporção pequena em meio a tantas visões de que tudo pode ser melhor graças aquele sorriso amigo.  Julgamos que a liberdade é simplesmente tomar as decisões sozinho, é ter pluralidade afetiva, é não se interligar a nenhuma crença, é ser parceiro até onde isso não vá mudar o percurso. Discordo. Penso que não há liberdade maior do que aquela construída na confiança, com relações saudáveis e equilibradas, com trabalhos em que o diálogo auxilie nas avaliações, com cada um colocando-se no lugar no outro. É essencial saber de suas prioridades, mas para humanizar os envolvimentos, não é possível ser pela metade e desconsiderar a bagagem e os anseios correspondentes a cada um que é especial em nossa vida.  Sem utopias, mas como eternizou Raul Seixas “um sonho sonhado sozinho é um sonho. Um sonho sonhado junto é realidade” e, nada mais compensador que ter pessoas que escolham domar seus medos e estejam dispostas a compreender as lágrimas, os excessos, as gargalhadas e os nossos devaneios. 
Qualquer tipo de amor só se entende assim quando a presença é a busca e o encontro é o caminho.